sábado, 21 de agosto de 2010

Co-dependência

Por Nilva Marcandali

Considerada uma patologia de preocupação mundial, a dependência química não atinge somente o usuário, mas também aos seus próximos, tornando-os co-dependentes.

Robert Subby (1984; apud Beattie, 2008:45) descreve co-dependência como:
“Uma condição emocional, psicológica e comportamental, que se desenvolve como resultado da exposição prolongada de um indivíduo a – e a prática de – um conjunto de regras opressivas que evitam a manifestação aberta de sentimentos e a discussão direta de problemas pessoais e interpessoais”.

Somente nos últimos 30 anos a co-dependência começou a ser tratada mundialmente pela área da Saúde Mental. O maior problema para este enfrentamento é o indivíduo admitir-se doente, aceitar-se como co-dependente, mesmo quando os sintomas são apresentados para ele. Grande parte dos familiares acreditam ser somente o dependente químico o necessitado de tratamento, portanto, para estes, basta que o dependente abandone seu vício para que os problemas se resolvam.

O co-dependente deve receber tanta ajuda psicoterapeuta, ou ainda mais, que o próprio dependente, pois, quer em períodos de uso, recuperação ou recaídas, o indivíduo dependente retornará ao contato e ao seu relacionamento com o co-dependente, e se, este não estiver em trabalho de práxis terapêutico, as condições favoráveis ao uso de substâncias químicas estarão presentes.

Portanto, a preocupação aqui não está só relacionada ao relacionamento presente do dependente com o co-dependente, mas ao passado do relacionamento que antecede a dependência química: ao meio social que precedeu e foi gerador da dependência química.

Além disto, agravam-se os fatores disfuncionais desta família com o aparecimento da dependência, e, mesmo quando este dependente já está em processo de recuperação, se não for trabalhado terapeuticamente todo o conjunto familiar, a disfunção geradora dos conflitos ainda permanece latente.

Normalmente é o familiar mais ligado afetivamente ao dependente que participa do grupo de apoio. Mães e esposas são a maioria nos grupos e normalmente são elas que formam o pilar sustentador do lar e lidam com os pontos de desequilíbrio, tentando ajustá-los. Mesmo que não estejam preparadas pra isto, em se tratando dos problemas com a dependência química, é a elas que normalmente atribuí-se esta função.

Como estar preparada para ajudar o familiar dependente químico em sua recuperação? Ajudando-se a si mesma em sua própria saúde emocional. E como fazer isto?
Buscar ajuda psicológica seria imprescindível, porém, nem todos possuem recursos financeiros para pagar uma psicoterapia, sendo assim, um grupo de auto-ajuda para co-dependentes seria a melhor opção, pois, além de serem gratuitos, há trocas de experiências com pessoas envolvidas pelo mesmo problema, que ouvirão de forma empática e retribuirão com suas experiências de erros e acertos.

A identificação com os participantes, bem como, sentir-se compreendido verdadeiramente por alguém que sofre as mesmas dores e problemas, é um grande alívio para os participantes destes grupos. É o início do tratamento em si.

Os grupos de auto-ajuda são alternativas eficientes de tratamento dos co-dependentes com resultados muito satisfatórios a curto prazo, entretanto, a participação continuada em um grupo de auto-ajuda, mesmo quando o dependente químico já encontra-se em abstinência, faz parte do processo de manutenção da recuperação, que traz resultados satisfatórios a longo prazo para os envolvidos: o dependente e os familiares co-dependentes.

Há características específicas, sintomas, na relação entre dependente-co-dependente e no próprio comportamento do co-dependente. Toda doença é caracterizada por sintomas e são estes que a identificam. No caso da co-dependência, há disfunções comportamentais e emocionais.

“A co-dependência pode manifestar-se no indivíduo como transtorno de personalidade ou como patologia da relação de um sistema” (Zampieri, 2004:134). Não reconhecida como doença pela DSW-IV (1995) ou CID-10 (1993), a co-dependência pode ser admitida como “construção social” (Ibid:65).

A relação de abuso emocional tanto por parte do dependente quanto do seu familiar, impede a verdadeira recuperação do dependente. Há um zelo excessivo por parte do familiar (co-dependente) que impede que o dependente adquira autonomia e auto-estima, tão necessárias para sua efetiva recuperação. Entretanto, o próprio familiar acaba por depender desta relação de zelo-comando, já que, é por trás dela que esconde suas próprias necessidades pessoais, como que, numa defesa de ter que admitir suas próprias fraquezas perante a vida e seu sentimento de impotência.

Mas porque isso ocorre nas famílias?
As pessoas são resistentes a mudanças e adaptações. Fica ainda muito mais complicado quando se convive em um grupo, como o familiar, onde é necessário incentivar as individuações de seus membros e ao mesmo tempo fazer funcionar uma dinâmica de unidade.

Com a freqüência em grupos de apoio, espera-se que, ao tomar conhecimento da existência e incidência destes sintomas, o familiar possa identificar-se de certa maneira com sua co-dependência e motivar-se a procurar ajuda para sua saúde emocional.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
 BEATTIE, Melody. Co-dependência Nunca Mais - pare de controlar os outros e cuide de si mesmo. 12ª ed. Rio de Janeiro: Nova Era, 2008. 287 p.
 FRANCO, Maria A. Santoro. Pedagogia da Pesquisa-Ação in Educação e Pesquisa, vol.31, n.3, p.483-502, São Paulo: Universidade Católica de Santos, set./dez. 2005.
http://www.unicentro.br/extensao/pde/cursos/abordagens/curso_pde_pesquisa_a%C3%A7%C3%A3o.pdf. Consultado em 15/04/2009.
 LEITE, Marcos Costa. Aspectos básicos do tratamento da síndrome de dependência de substâncias psicoativas. 2ª. Ed. Brasília: Presidência da República, Gabinete de Segurança Institucional, secretaria Nacional Antidrogas, 2001.
 ZAMPIERI, Maria A.J. Codependência – o transtorno e a intervenção em rede. São Paulo: Agora, 2004. 283p.