sexta-feira, 23 de julho de 2010

Efeito Catártico da Arte

Por Nilva Marcandali

No texto anterior, falou-se sobre a catarse que poderá ser provocada pela leitura de um texto literário ou no contato com qualquer forma de arte. Catarse ou ab-reação, pela visão da psicologia analítica, define-se:

“Reedição emocional de uma vivência traumatizante que, por meio da confissão, despotencializa o afeto relativo à experiência traumática. Sua ação mais fundamental não é a simples liberação da carga afetiva ligada ao trauma, mas, sim, possibilitar á integração dessa carga energética ao ego, permitindo-lhe exercer controle sobre o afeto.” (Grinberg, 2003:222-223)

Portanto, vivenciamos uma catarse quando a experiência emocional externa encontra seu reflexo em nosso mundo interior. Esta experiência emocional ocorre muito mais do que pensamos ou percebemos e ao contato com diferentes formas de arte ou situações cotidianas. Não só a literatura, mas ao ouvir uma música, ver um filme, apreciar uma pintura, assistir uma novela e até mesmo quando assistimos o noticiário jornalístico.
As novelas, tão populares, conseguem abranger um leque de emoções muito variado e que encontra reflexos emocionais em diferentes telespectadores. A jovem apaixonada e não correspondida, a mãe que sofre com os problemas do filho, o trabalhador que foi demitido; estão entre as questões que perturbam o ser humano, e que, sem enfrentamento ou resolução, pelo sofrimento que provocam, ficam escondidas em nosso inconsciente, provocando outros tipos de sofrimento, mascaradas de outras maneiras e com outros nomes.
Portanto, a catarse acaba por expurgar o problema que está oculto, a emoção que estava sendo reprimida, às vezes em pequenas doses, outras vezes de forma definitiva, e assim, entramos em contato com o que temíamos.
Por exemplo, quando alguém perde um ente querido e evita pensar sobre qualquer coisa que remeta à lembrança do fato, protegendo-se contra a dor do luto. Então, ao assistir um filme ou ler sobre uma situação de morte e lamentação por perda, a pessoa vivencia seu próprio luto e alivia um pouco sua dor, ao mesmo tempo, ensaia a sua realidade ao colocar-se no lugar do personagem fictício.
Faz-se também instrumento de autoconhecimento e evolução emocional, quando identifica-se uma dor e aprende-se a lidar com ela.
Abaixo, um trecho literário, que figura de maneira tão poética tal catarse:

“Não choro por nada que a vida traga ou leve. Há porém páginas de prosa que me têm feito chorar. Lembro-me, como do que estou vendo, da noite em que, ainda criança, li pela primeira vez numa selecta o passo célebre de Vieira sobre o rei Salomão. `Fabricou Salomão um palácio...´.E fui lendo, até o fim, trêmulo, confuso: depois rompi em lágrimas, felizes, como nenhuma felicidade real me fará chorar, como nenhuma tristeza da vida me fará imitar. Aquele movimento hierático da nossa língua majestosa, aquele exprimir das idéias nas palavras inevitáveis, correr de água porque há declive, aquele assombro vocálico em que os sons são cores ideais – tudo isso me toldou de instinto como uma grande emoção política. E, disse, chorei: hoje, relembrando, ainda choro. Não é – não – a saudade da infância de que não tenho saudades: é a saudade da emoção daquele momento, a mágoa de não poder já ler pela primeira vez aquele grande sinfônica.
... Minha pátria é a língua portuguesa.”
(Fernando Pessoa - Livro do Desassossego; Transcrição de: Klein, 2009:05)


Referências Bibliográficas:
GRINBERG, Luiz Paulo. Jung, o homem criativo. 2ª ed., São Paulo: FTD, 2003.
KLEIN, Ligia Regina. Fundamentos do texto em Língua Portuguesa. Curitiba: IESDE Brasil S.A., 2009. (Livro Virtual do Curso de Letras da UNICID)

domingo, 11 de julho de 2010

A Literatura como agente terapêutico

Por Nilva Marcandali

VYGOTSKY
Formado inicialmente em Literatura, Vygotsky começou sua carreira profissional com apenas 21 anos, já possuindo notoriedade, como crítico literário e palestrante. Um indivíduo extremamente epistemológico, estudou várias outras áreas, entre elas: Medicina, Psicologia, Pedagogia e Filosofia. Cientista inovador, defendeu “a relevância do entendimento subjetivo da mensagem, pelo receptor,” na leitura de um texto literário. Atribuiu à arte um “papel catártico na vida das pessoas no mundo cotidiano. A arte poderia proporcionar `um gatilho´ para a síntese da visão de mundo revisada de uma pessoa, quando a pessoa experimenta a catarse com seu encontro com a arte” (Vygotsky, 1925/1986:328; apud Paula & Mendonça, 2009:32).
“Seu trabalho com arte capacitou-o a tratar de problemas psicológicos complexos” (Paula & Mendonça, 2009:33). Como resultado desta fusão de saberes, Vygotsky transformou seu estudo sobre Hamlet, de Shakespeare, realizado na época em que era estudante de Literatura, em sua obra Psicologia da Arte, “na qual discute a influência da literatura no indivíduo” (idem:27).

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
PAULA, Ercília M.T. de & MENDONÇA, Fernando Wolff. Psicologia e Educação. Livro Virtual do Curso de Letras da Universidade Cidade de São Paulo. Curitiba: IESDE Brasil S.A., 2009. 212p.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

A contribuição da religiosidade na construção da subjetividade do adolescente

Por Nilva Marcandali

RESUMO
A prática de uma religião inspira o comportamento daqueles que estão comprometidos com ela. O adolescente em seu processo de desenvolvimento procura identificações para formar sua identidade, normalmente em grupos de amigos afins. Esta pesquisa tem como objetivo saber se a cultura da religião pode favorecer de maneira saudável este adolescente, ao participar de cultos religiosos ou grupos inseridos na igreja. Assim, transformando-o em um adulto ético, comprometido com a sociedade e consigo mesmo. Para isto, buscou-se embasamento em bibliografia da psicologia do adolescente, bem como, pesquisa de campo com adolescentes inseridos no meio religioso. Foram realizadas cerca de 50 entrevistas. A maioria dos entrevistados afirmou sobre o bem-estar e sobre as transformações positivas que ocorreram em si próprios e no meio que vivem. Os grupos religiosos mostraram-se positivos como instrutores e apoiadores neste processo de auto-valorização, solidariedade e fraternidade.
Palavras-chave: religião, adolescente, grupos, identidade, fraternidade.

INTRODUÇÃO
A prática religiosa é um exercitar de valores, ética e solidariedade ao próximo, bem como, a busca do autoconhecimento e valorização de si mesmo. Conceitos são embutidos e crescem paralelamente aos processos cognitivos, formando o indivíduo em sua subjetividade.
As sociedades, freqüentemente, desenvolvem normas de comportamento com a finalidade de se precaver contra o inesperado, o imprevisível, o desconhecido e de se estabelecer certo controle sobre as relações entre o homem e o mundo que o cerca (MARCONI E PRESOTTO, 1992:163-164 apud Oliveira, 2008).
Novos traços da organização familiar deste novo milênio e toda complexidade para inserção social do adolescente traz problemáticas de conflito interno, “uma vez que, é entre os adolescentes inseridos neste contexto que a problemática das atuações dramáticas vem ganhando largo espaço (...) onde vigoram a violência, a insegurança e o atravessamento de uma dimensão traumática sempre presente na ocasião da adolescência”. (SAVIETTO, 2007: 439-440)
O adolescente, na busca de sua identidade começa a confrontar suas crenças, tentando adaptá-las ao que acredita ser bom para ele. Podemos então entender, que há uma reconstrução de si sob um ponto de vista temporal e pessoal. Novos interesses, um novo olhar e mesmo novos grupos sociais, ou seja, um novo meio integrando esta subjetividade e transformando-a.

Objetivos
 Verificar, de que maneira, os princípios religiosos contribuem para que o adolescente construa valores para uma vida pessoal e social satisfatória.
 Verificar como o adolescente poderia desenvolver sua subjetividade em bases sólidas, através do conhecimento e prática dos princípios religiosos, respeitando a si próprio e ao próximo.
 Levantar dados sobre o quanto a religiosidade beneficia o desenvolvimento do adolescente, para tranformar-se em um adulto saudável, física e emocionalmente.

CONCLUSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em meio ao processo de “adolescer” (SAVIETTO, 2007), o adolescente questiona-se sobre sua identidade e sozinho não possui condições de construir sua subjetividade. Necessita de direcionamento mínimo para fazer suas próprias escolhas.
A maioria dos adolescentes está em constante desacordo com os valores familiares, porém, nem mesmo sabe quais são os valores que pretende seguir. Entretanto, o desacordo faz parte do processo conflitante da evolução e busca da sua subjetividade. Portanto, neste conflito com sua família, o adolescente vai em busca de algum grupo de amigos que o compreendam e o aceitem.
Neste novo grupo ele vai encontrar, através da identificação, seus novos direcionamentos. Até mesmo a estereotipia, ou seja, o padronismo que acontece em grupos de jovens, como vestir-se, falar gírias próprias, escutar as mesmas músicas e ir aos mesmos lugares - são maneiras do jovem firmar-se e encontrar segurança para a busca de sua subjetividade.
Neste sentido, a preocupação dos pais em estimulá-lo a freqüentar locais que propiciem o encontro com grupos positivos, por exemplo, grupos envolvidos com arte, esporte, estudo ou religioso, é importantíssima, pois assegura que o adolescente depare-se com valores e códigos de conduta que serão benéficos para seu desenvolvimento e para sua vida adulta.
Comportamentos são modificáveis. Quando confrontados com interações sociais novas podem sofrer transformações radicais, promovendo ajustamentos e alterações na subjetividade.
Com base no que foi pesquisado, a religião é um dos meios pelo qual o homem busca, em todos os tempos, às vezes com mais ou menos intensidade, encontrar respostas para as questões básicas da razão da sua existência.
Portanto, a religião é uma das alternativas neste encontro consigo mesmo.
Ao freqüentar um grupo de alguma comunidade religiosa, grupo este que costuma ser voltado à busca de valores morais e sociais, pode beneficiar o adolescente a construir sua subjetividade com princípios positivos e benéficos a si mesmo e àqueles a sua volta.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
 DURKHEIM, Émile. As formas elementares da vida religiosa. 2ª edição. São Paulo: Paulus, 1989. 526p.
 FIGUEIRA, S.A. O “moderno” e o “arcaico” na nova família brasileira: notas sobre a dimensão invisível da mudança social in FIGUEIRA, S.A. (Org.) Uma nova família? O moderno e o arcaico na família de classe média brasileira. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,1987.
 MARCONI & PRESOTTO (1992:163-164) apud Maria Marta A. de Oliveira. Religião e Magia in Apostila de Antropologia. São Bernardo do Campo: UNIBAN, mar. 2008.
 MARCONI, Marina de Andrade; PRESOTO, Zélia Maria Neves. Antropologia: uma Introdução. São Paulo: Atlas, 2005.
 MOUSSEN, Paul. Desenvolvimento psicológico da criança. Traduzido do original: The psychological development of the child. Nona edição. Rio de Janeiro: Zahar, 1980.
 SAVIETTO, Bianca Bergamo de Andrade. Passagem ao ato e adolescência contemporânea: pais “desmapeados”, filhos “desamparados” in Revista Latino americana de Psicopatologia fundamental. Órgão oficial da Assoc. Univ. de Pesquisa em Psicopatologia Fundamental. Vol.X. n.3. Setembro/2007. p.395-576.
 TURNER, Jonathan H. Sociologia - Conceitos e Aplicações. São Paulo: Makron Books, 2000. 253p.

São Bernardo do Campo, 2008.